por Dr. Leonardo Machado
Aos poucos minha vida foi
perdendo o sabor.
O salmão ao molho de
maracujá que eu tanto gostava de preparar para o meu esposo já não era mais
temperado com o meu entusiasmo. Tudo parecia ser feito de modo maquinal. Sem
vida. Sem gosto. Incrivelmente, eu não conseguia sentir mais prazer!
Quando dei por mim, estava
na cama sem energia. As forças, antes robustas, não mais me visitavam. E
comecei a perceber que os atrasos de meus filhos no colégio se tornaram
frequentes – o que nunca acontecia - pois eu não conseguia me levantar no
horário habitual. Era como se meu corpo todo fosse um chumbo.
A situação foi se
agravando e, desesperado, meu marido me levou a um médico psiquiatra, pois algo
de muito errado deveria estar acontecendo comigo.
Provavelmente, em meu
estado normal, eu teria relutado – é claro! Mas naqueles dias me faltaram até
forças para isto.
Logo o médico percebeu a
minha fisionomia sem vida, sem expressão. Perguntou-me se eu estava chorando
mais do que o habitual. Foi quando me dei conta que nem chorar eu conseguia –
talvez as lágrimas também não tivessem força para sair!
E, depois de uma longa
consulta, o veredicto – eu estava com depressão. Nunca me imaginei passando por
aquilo. Mas, de fato, deveria ser isto.
Me submeti ao tratamento
médico. E, assim que constatei que a vontade voltou, resolvi iniciar uma
psicoterapia.
O que me levara a ficar
daquele jeito? Qual era o motivo de eu ter deprimido?
Honestamente, esperava que
esta resposta pudesse ser dada pelo meu psiquiatra. Surpreendi-me, no entanto,
quando ele, ao invés disto, me questionou:
-
O quê você aprendeu com a depressão?
Pareceu-me uma pergunta
estúpida! O que eu poderia aprender naquele estado em que fiquei ou com aquela
situação?
Não consegui, portanto,
respondê-lo. E, sinceramente, quase que não volto para o consultório dele.
No entanto, aquela
pergunta martelou na minha cabeça por dias. E, sem me dar conta, passei a
refletir na minha própria vida. Nunca mais queria não conseguir sentir prazer!
Nunca mais queria não ter forças!
Comecei a me dar conta,
então, que, chegando naquilo que eu considerava ser o fundo do poço, me
esforçaria para não voltar para lá.
Voltei, então, para o
médico. Não desmarquei a consulta. E logo de início lhe disse:
- Confesso
ter desejado que o senhor me dissesse tudo tão facilmente como me prescreveu o
medicamento.
- Na
vida, há perguntas que são difíceis de serem respondidas. Parece-me que a
depressão não é daquelas doenças uni-causais. Apesar disto, ao invés de te
tornares uma cientista da tua própria vida, podes amadurecer com esta
experiência e ampliar a visão.
- E
foi exatamente isto que eu percebi ter acontecido comigo...
Talvez eu não consiga
captar todos os motivos que me fizeram deprimir. Certo, porém, é que eu sai
transformada. Melhor, eu resolvi me transformar!
Os maracujás? Deixei-os mais saborosos. E, ao
invés de só servir meu amado, passamos a nos sentar lado a lado e conversar
largamente nos almoços apertados do dia a dia. Eu comecei a comer, igualmente,
o salmão – é claro! E, muitas vezes, a compartilhar o melhor pedaço com ele –
por que não?!
Meus filhos? Passei a me
preocupar não só com os horários. Percebi que o caminho da nossa casa até a
escola era longo demais para desperdiça-lo com gritos do estresse. E naqueles
minutos foram construídos momentos de amor e de interação.
E,
aos poucos, minha vida foi retemperando o sabor.
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